A entrevista com a psicóloga Rafaela Armesto destaca como o corpo e a mente reagem às mudanças ambientais. Ela ressalta as estratégias para combater os sintomas causados pelos efeitos climáticos. Além disso, na entrevista, a profissional enfatiza a importância de reconhecer os sinais de desequilíbrio emocional e buscar ajuda quando necessário.
01
CM
Camilli pergunta
Quais são as consequências das mudanças climáticas na saúde física e mental das pessoas?
RA
Rafaela responde
Os impactos não são os mesmos para todos. Em comunidades tradicionais como povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e agricultores familiares, onde o território é fonte de identidade, cultura e sobrevivência, as mudanças no clima causam danos profundos. A perda da floresta, do solo fértil, da água limpa e dos ciclos naturais compromete modos de vida ancestrais e também afeta a saúde emocional e espiritual desses povos. Portanto, o impacto do clima não é apenas meteorológico, é humano, profundo e desigual. O clima muda, e a nossa mente responde.
As mudanças climáticas não afetam apenas o meio ambiente, elas impactam diretamente a saúde física e mental das pessoas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já declarou que a crise climática representa a maior ameaça à saúde global no século XXI. Nosso corpo responde ao desequilíbrio ambiental. O calor excessivo pode causar insônia, fadiga, alterações no apetite e desregulação hormonal. A poluição do ar agrava doenças respiratórias como asma e bronquite, e os eventos climáticos extremos como enchentes, secas e queimadas, trazem riscos diretos à integridade física. Mas os impactos vão além do corpo, eles atravessam também a mente. Catástrofes ambientais podem gerar sintomas como irritabilidade, angústia, tristeza profunda e um sentimento coletivo de esgotamento. Muitos já nomeiam essa dor silenciosa como ecoansiedade, um medo constante e difuso do colapso ambiental e do futuro do planeta. Também se observa um crescimento de casos de Estresse pós-traumático em pessoas expostas a desastres naturais, Luto ambiental devido a perda de ecossistemas ou de territórios afetivos, sentimento de Desesperança crônica, especialmente entre jovens que cresceram cercados por previsões sombrias. De fato, um estudo publicado na revista científica The Lancet (2021), com mais de 10 mil jovens entrevistados em 10 países, revelou que 59% se sentem “muito” ou “extremamente” preocupados com as mudanças climáticas, e mais da metade acredita que seus governos estão falhando em protegê-los.
02
CM
Camilli pergunta
Qual é a melhor forma de combater os sintomas causados pelas alterações no tempo?
RA
Rafaela responde
Cuidar da alimentação, manter uma rotina de descanso e buscar contato com a natureza, são formas simples e poderosas de regulação emocional. Mas, acima de tudo, é preciso respeitar o ritmo interno, há dias em que o corpo está mais cansado e a mente mais sensível, e tudo bem. O autocuidado nasce do respeito, não da cobrança, ele não é luxo, é uma resposta saudável diante de um mundo em transformação.
Antes de combater os sintomas, é essencial reconhecê-los e compreendê-los. O corpo e a mente reagem às mudanças ambientais, e a adaptação começa com o respeito aos limites pessoais e coletivos. Vivemos em uma cultura que valoriza o controle e a produtividade constantes, mas o clima nos ensina sobre a vulnerabilidade, tanto da natureza quanto da nossa saúde. Quando o tempo muda, o corpo pede adaptação, e a mente precisa aprender a acompanhar esse movimento com gentileza.
03
CM
Camilli pergunta
Qual é o público mais afetado pelas mudanças climáticas?
RA
Rafaela responde
Mas há um grupo que tem sofrido silenciosamente que são os jovens. Eles cresceram em meio a alerta, tragédias e previsões sombrias, carregam um medo difuso sobre o futuro, muitas vezes, sem saber nomear. Por isso, é essencial que a gente ofereça escuta, acolhimento e exemplos de esperança. A juventude precisa ver que ainda há caminhos possíveis e que cada pequeno gesto importa.
Todos somos afetados, mas nem todos da mesma forma. As pessoas mais vulneráveis como idosos, crianças e aquelas que vivem em regiões de risco sentem os impactos físicos e emocionais de forma mais intensa.
04
CM
Camilli pergunta
Diante do aumento dos desastres ambientais e da constante exposição a más notícias, o indivíduo tende a ficar mais ansioso. Qual seria a melhor forma de lidar com o estresse nesses momentos?
RA
Rafaela responde
O excesso de más notícias nos desconecta daquilo que é essencial. A mente humana não foi feita para lidar com tragédias em tempo real, o tempo todo. Por isso, é importante criar pausas conscientes como limitar o consumo de informações, buscar silêncio, respirar e se reconectar com o presente.
05
CM
Camilli pergunta
Existe tratamento para os sintomas físicos e emocionais provocados pelas mudanças climáticas?
RA
Rafaela responde
Sim, existe e começa pelo acolhimento emocional. Não é fraqueza sentir medo, tristeza ou angústia diante de um mundo em transformação. É humano. A psicoterapia pode ajudar a compreender esses sentimentos, dar nome a eles e transformá-los em movimento e cuidado. Em alguns casos, é importante o acompanhamento médico, especialmente quando o corpo começa a reagir com sintomas mais intensos. Enquanto o planeta busca equilíbrio, nós também precisamos aprender a restaurar o nosso. As mudanças climáticas são um lembrete de que tudo está interligado. O que acontece fora reflete dentro e vice-versa, cuidar da mente é também cuidar da Terra. Porque um planeta saudável começa com pessoas emocionalmente conscientes.